"... faltam-me as vísceras de fora quando as palavras se deixam antever. " in Memórias Internadas

9.3.12

Ensaios fotográficos . Manoel de Barros

O PROVEDOR


Andar à toa é coisa de ave.
Meu avô andava à toa.
Não prestava pra quase nunca.
Mas sabia o nome dos ventos
E todos os assobios para chamar passarinhos.
Certas pombas tomavam ele por telhado e passavam
as tardes frequentando o seu ombro.
Falava coisas pouco sisudas: que fora escolhido para
ser uma árvore.
Lírios o meditavam.
Meu avô era tomado por leso porque de manhã dava
bom-dia aos sapos, ao sol, às águas.
Só tinha receio de amanhecer normal.
Penso que ele era provedor de poesia como as aves
e os lírios do campo.


MANOEL DE BARROS
POESIA COMPLETA


CAMINHO  2011

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