"... faltam-me as vísceras de fora quando as palavras se deixam antever. " in Memórias Internadas

11.3.12

O fio da fábula . Jorge Luis Borges

.

      O fio que a mão de Ariadne deixou na mão de
Teseu (na outra estava a espada) para que este se
aventurasse no labirinto e descobrisse o centro, o
homem com cabeça de touro, ou como pretende 
Dante, o touro com cabeça de homem, e o matasse
e pudesse, já executada a proeza, desentrelaçar as
teias de pedra e voltar para ela, para o seu amor.
      As coisas aconteceram assim. Teseu não podia
saber que do outro lado do labirinto estava o outro
labirinto, o do tempo, e que em algum lugar de
antemão fixado estava Medeia.
      O fio perdeu-se, o labirinto perdeu-se também.
Agora nem mesmo sabemos se nos rodeia um labirinto,
um secreto cosmos ou um caos imponderável. O nosso
mais grato dever é imaginar que há um labirinto e
um fio; talvez o encontremos e o percamos num acto
de fé, numa cadência, no sonho, nas palavras que se
chamam filosofia ou na mera e simples felicidade.

                                                         Cnossos, 1984

JORGE LUIS BORGES
Os Conjurados

DIFEL . 1985

1 comentário:

  1. E por coincidência também no livro que comecei a ler ontem "Próspero morreu" de Ana Luísa Amaral encontro também Ariadne e Teseu.

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