"... faltam-me as vísceras de fora quando as palavras se deixam antever. " in Memórias Internadas

25.12.11

coitado do bacalhau

Panamá, Cunas
     
                                     CANTO DA SOLIDARIEDADE


Distribua-se o peixe do mar,
distribua-se o sável,
distribua-se o peixe-serra pequeno,
distribua-se o sável pequeno,
distribua-se o tubarão,
distribua-se o pargo.
O caminho do peixe, parece que Deus o fez de ouro.
O flautista chama pela rapariga,
diz-lhe que se agarre bem à ponta da sua camisa.
Distribua-se o mero,
distribuam-se as conchas presas às rochas,
distribua-se a lagosta,
distribuam-se os caranguejos,
distribua-se o marisco que vive como se risse com a boca aberta aferrada à rocha,
distribua-se a carne dos moluscos do rio,
distribuam-se os camarões,
distribua-se o mero do rio,
distribua-se a iguana que se esconde na copa da árvore de pau-santo.
De ouro, o caminho do peixe, parece que o fez de ouro,
parece que Deus fez de ouro o caminho do peixe.



VERSÃO : HERBERTO HELDER

ROSA DOS MUNDOS
2001 POEMAS PARA O FUTURO

2.12.11

O espaço, que ninguém pode desenhar

O espaço, que ninguém pode desenhar, porque é imperceptível como
meio e origem dos nossos gestos e da nossa permanente habitação, é
o fundamento absoluto do nosso ser temporal e da nossa continuida-
de de sempre recomeçada. Se essa coordenada da nossa existência vacila,
perde-se o equilíbrio essencial e a nossa relação viva com o mundo
torna-se impossível e insustentável. Por isso, a construção será uma
construção do espaço com todas as aberturas necessárias para que a 
orientação vital se assegure nas grandes linhas das paisagens e nas
passagens que serão as órbitas suaves e frementes de imprevisíveis
astros.


O Aprendiz Secreto
António Ramos Rosa

UMA EXISTÊNCIA DE PAPEL
edições quasi